sábado, 28 de maio de 2011

Hoje o dia está bom pra... o verdadeiro strogonoff

Na época do colégio, as aulas de educação física jamais me despertaram algum interesse, a não ser na 7ª série. Naquele ano, a escola determinou que teríamos aulas nas manhãs de quinta-feira, para não tomar o horário das disciplinas na parte da tarde. E então era assim: a quinta-feira era o dia mais esperado da semana. Mas não se engane, meu interesse tinha início quando a aula de educação física terminava. Depois da inconveniente atividade obrigatória seguíamos ansiosos – meu irmão, na época com 10 anos, e eu – para o Pichita Lanna, restaurante italiano na Savassi que atendia grandes empresários da região, homens de negócios e suas distintas senhoras. E que, nos almoços de quinta-feira, tinha também o privilégio de receber meu irmão e eu – crianças famintas e suadas – que destoávamos um pouco do conjunto, mas sabíamos nos comportar direitinho à mesa, assim como mamãe ensinou.

E foi o Pichita que me apresentou o que até hoje eu tenho como referência de um strogonoff perfeito. Tão perfeito que, enquanto meu irmão semanalmente se revezava em filé à parmegiana, arroz à piemontesa, spaghetti à carbonara, eu nunca experimentei outro prato que não fosse o sagrado strogonoff de filé mignon. Há alguns anos que fui almoçar no Pichita pela última vez (acho que foi em 2006, para me inspirar no dia da prova de seleção do mestrado) mas a qualquer tempo, posso fechar os olhos e consigo sentir o sabor daquele strogonoff, inigualável.

Então, de uns tempos pra cá, passei a perseguir a receita do verdadeiro strogonoff, cuja origem é a culinária russa, adaptada pelos franceses, e perfeitamente executada pelos italianos (Pichita Lanna que o diga!) mas que já foi tão modificada e reinventada pelo mundo afora que é bem difícil encontrar a original. O carioca Chico Junior, que se auto-define como ‘jornalista, viajante e cozinheiro’, conta no seu blog, de forma muito interessante, a história do strogonoff. E dá também algumas receitas.

Bom, eu cozinhei – e experimentei – a maioria das receitas tidas como “verdadeiras” até chegar a uma que mais se aproximasse do meu referencial, embora ainda assim o strogonoff do Pichita permaneça no topo da experiência de um bom strogonoff. Devo dizer que sou cheia de frescura e bem mais radical que o Chico quando o assunto é strogonoff. Não me venha com strogonoff de frango ou com receita que leve molho de tomate ou – a morte – ketchup. Milho e palmito, por favor, use num pastel ou empadão, no meu strogonoff não. Não preciso falar o que penso das azeitonas, né? Ok. Em compensação, acho perfeitamente aceitável usar creme de leite em lata no lugar do creme de leite azedo. Ou mesmo usar champignons em conserva no lugar dos frescos. Afinal, de azeda e fresco já bastam eu e meu strogonoff.

O que percebi é que o mais importante em uma boa receita de strogonoff, além da escolha dos ingredientes, são as dicas que vão junto das instruções. Por isso, a minha receita, que é na verdade um apanhado de outras tantas, vai cheinha de dicas. Bon appetit!

Strogonoff Pichita Lila
- 1 kg de filé mignon
- Páprica doce, sal e pimenta do reino moída na hora, a gosto
- 1 cebola grande
- 4 colheres de manteiga
- ½ xícara de vinho branco
- 1 tablete de caldo de carne dissolvido em 1 ½ xícara de água fervente
- 350 g de champignons inteiros
- 3 latas de creme de leite

Como fazer
O filé deve ser cortado em cubinhos pequenos. Dica: vale a pena procurar um bom açougue. Eu vou a um que mais parece uma boutique de carnes de tão limpo e caprichado que é o atendimento. Os moços me avisam no dia que chegam as peças de filé, fresquinhas, e eu peço pra reservar. Quando eu chego pra buscar eles me mostram o filé pra ver se está do meu gosto, limpam, pesam e picam em cubinhos de exatos 1,5 cm. E ainda empacotam em saquinhos separados o excedente do que vou utilizar na receita, etiquetando com o peso, pra eu poder congelar e usar em outra ocasião. O kg do filé nem é tão mais caro que nos outros lugares. O que eu pago a mais compensa pelo serviço de primeira.

Tempere a carne com o sal, a pimenta e a páprica. Misture bem para incorporar à carne os temperos. Dica: sal e pimenta são essenciais, mas são perigosos e podem comprometer a receita. Use com moderação. Em caso de dúvida, não peque pelo excesso, use menos nesta fase e deixe para acertar o tempero no final. Não esqueça que ainda vamos usar caldo de carne que já é bem salgado. Se você nem faz idéia do quanto usar de temperos, comece com 1 colher de chá de sal, 1 colher de cafezinho de pimenta e 3 colheres de chá de páprica.

Derreta duas colheres de manteiga em uma frigideira grande e vá fritando a carne, aos poucos, em fogo alto, sem deixar juntar suco. Dica: a carne deve fritar e não cozinhar! O filé, se cozido, perde a água e fica duro. Para não juntar suco, frite aos poucos os cubinhos por no máximo 3 minutos em fogo alto e vá retirando a carne à medida que for fritando. Reserve a carne, à parte, e utilize a panela “suja” para a próxima etapa.

Coloque na frigideira a manteiga restante e doure a cebola, até que fique bem macia e transparente. Dica: a cebola deve ser ralada ou picada bem fininha, quase invisível. Ela é a base do caldo, dá sabor e encorpa. Adicione o vinho e o caldo de carne. Deixe ferver e evaporar um pouco, para engrossar. O caldo deve reduzir até ficar espesso, quase um creme.

Se for usar champignons em conserva, drene todo o líquido antes de usá-los. No caso de champignons frescos, é preciso dar uma fervura para amaciá-los um pouco. Corte os champignons em quatro partes e adicione ao caldo, juntamente com a carne.

Em seguida incorpore delicadamente o creme de leite sem soro, aos poucos, e em quantidade suficiente. Dica: para retirar o soro do creme de leite, deixe a lata na geladeira por 4 horas. Em seguida, vire a lata, faça dois furos no fundo e escorra o soro. O ideal mesmo é que se use o creme de leite fresco, mas se não for possível, é importante dar preferência para o creme de leite em lata, pois o sabor e a textura são completamente diferentes do creme de leite em caixinha. Eu uso sempre duas lata inteiras e a terceira vou adicionando aos poucos, até chegar no ponto, mais ou menos cremoso, conforme o gosto do freguês. Para quem gosta de um molho menos espesso, aconselho ao invés de uma terceira lata de creme de leite, acertar a textura com o creme de leite em caixinha, que é menos encorpado e de sabor mais suave.

Verifique o sal e acerte o tempero, se necessário. Retire do fogo antes de ferver. Sirva a seguir, com arroz branco e batata palha. Dica: até a batata palha é importante! Nada substitui uma batata palha feita em casa, frita na hora e bem sequinha. Mas como é muito complicado fazer uma boa batata palha (mais difícil que o próprio strogonoff, eu diria), uso sempre a batata da Yoki – Premium Extra Fina, da embalagem dourada. Faz toooda a diferença. Experimente e nunca mais você aceitará outra batata palha pra acompanhar um strogonoff tão especial.

Rendimento: 6 a 8 pessoas, dependendo da fome - e da vontade de comer.